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Os Cão da Redinha

       Todos os grupos humanos têm memória e essas memórias expressam um bem cultural. O bloco “Os Cão da Redinha” que sai às ruas do bairro da Redinha em Natal toda terça-feira de carnaval, cujo abadá é a lama retirada do manguezal, é um bom exemplo disso e deveria ser reconhecido como patrimônio imaterial do nosso estado. De acordo com Lima Júnior e Maia (2006) Patrimônio Imaterial é tudo aquilo que se refere a memória e tradição de um povo que se mantêm vivas através dos seus modos de saber e ofício, manifestações populares e formas de expressão. Todos os anos mais de 10 mil pessoas reúnem-se no mangue próximo a ponte Newton Navarro para se “vestir” de lama e sair brincando pelas  ruas da praia da Redinha e Redinha Nova, ao som de marchinhas de carnaval, orquestra de frevo e nesse ano juntou-se a brincadeira o grupo de percursão Pau e Lata.

 

            Não se sabe ao certo qual foi a data de início, mas os brincantes que acompanham o bloco há anos afirmam que ele surgiu nos anos 60. Há duas versões de como essa brincadeira surgiu: a primeira é que três pessoas, Canindé (Zé Lambreta), Luisinho e Lula, todos moradores do bairro da Redinha, juntaram-se para melar-se de lama e sair pelas ruas batendo latas e panelas. Dizem também que eles pegavam uma criança, enlameava-a e a colocava dentro de uma rede de pesca para sair brincando com eles pelas ruas do bairro. A brincadeira tinha fim por volta do meio dia quando todos retornavam ao mangue para comemorar com uma grande feijoada. A outra versão, a que é mais plausível, contada pelos próprios brincantes do bloco, é que os fundadores são José Gabriel de Góis (Zé Lambreta) e Francisco Ribamar de Brito (Dodô) que em 1965, em um momento de bebedeira com os amigos tiveram a ideia de se “vestir” de lama e saírem pelas principais ruas da praia da Redinha. O bloco foi batizado pelas próprias pessoas do bairro, que ao verem Zé Lambreta, Dodô e seus amigos lambuzados de lama no meio da rua gritavam “olha os cão!”.

        Como em todo e qualquer bloco, em seus primeiros anos “Os Cão da Redinha” saía às ruas com um pequeno grupo de foliões formado pelos próprios moradores do bairro. Ao passar dos anos o bloco foi crescendo e ganhando a notoriedade das pessoas de outros lugares, e com isso, novos acessórios foram acrescentados às “fantasias” como chifres, rabos, colares, etc, como podemos observar nessa reportagem exibida este ano pela Inter Tv Cabugi: http://goo.gl/NhxAhO

 

       Para que um bem seja considerado Patrimônio Imaterial, é necessário, primeiramente, que a população conheça e se envolva diretamente com a prática popular-cultural, e além disso reconheça que tal manifestação é um fragmento da memória do seu povo. E através da fidelidade e envolvimento dos brincantes “Os Cão” em todos esses anos com o bloco fica claro que esse reconhecimento e pertencimento é tido não só pelos moradores do bairro mas também pelos veranistas e turistas de outras localidades do país e inlusive do mundo como vimos na reportagem citada acima. Logo a diante é preciso que se faça um registro ou inventário, por meio dos órgãos públicos junto a comunidade, dessa prática cultural para que dessa forma seja iniciado o processo de salva-guarda desses saberes e fazeres da comunidade. Mas antes de tudo, como falei anteriormente, a comunidade tem que estar ligada diretamente às essas práticas e reconhecer a importância que a manifestação tem para àquele lugar. 

          Os moradores da Redinha contam que o bloco têm muita importância para o bairro, pois influencia socio-economicamente, o depoimento de um morador do bairro descrito por Araújo (2013, p.20) demonstra muito bem isso:

EA Redinha antes do bloco “Os Cão”, não era calçada, não tinha a praça do cruzeiro, não tinha nenhum ônibus e o meio de locomoção era só por bote a vela e lancha a motor. Quando o cemitério perto da praça foi construído as ruas eram todas feitas de barro vermelho. Numa casa perto da praça existia os ‘’Dramas’’ pois antigamente não existia essas ‘baladas’ de hoje e todo mundo se reunia para brincar o ‘’drama’’[...]. Assim era a Redinha, calma, pequena e bem simples. (Entrevistado apud ARAÚJO, 2013, p. 20)

Para mais informações sobre cadastro e registro de bens imateriais, acesse: http://portal.iphan.gov.br/

 

 

Referências:

ARAÚJO, Allan Phyllipe Gomes Casemiro de. Carnaval da Socialidade: Os Cão, um Eterno Mascarado em Redinha. Natal, 2013.

LIMA JÚNIOR, Francisco Soares de; MAIA, Isaura Améçia de Sousa Rosado. Patrimônio Imaterial. Natal: Fundação José Augusto, 2006. (Coleção Patrimônio Cultural Potiguar – Cartilha 1)

Fotos:

 http://gilvandejacana.blogspot.com.br/2014/03/bloco-os-cao-completa-50-anos-pelas.html

Autora: LARISSA SALES

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